Mulheres em casa, homens na rua. Mulheres, família; homens, negócios. Mulheres castas; homens promíscuos. Na Bahia da Independência, esse tipo de relação homem/mulher só vale para as brancas ricas, já que a idéia de ficar trancada dentro de casa não era bem vista por uma descendente de índios.
Até 1808 não existiam muitas mulheres brancas no Brasil. Isso muda com a chegada da família real, quando se inicia o fluxo de portuguesas para cá. Essas viviam como as européias: trancadas em casa, cuidando dos filhos e do lar. Estudavam em casa ou em instituições religiosas e, embora soubessem ler, quase sempre eram proibidas de escrever. Costumavam se casar entre os 15 e 20 anos de idade e caso cometessem adultério, eram largadas pelo marido, arcavam com o estigma de “desonradas” e perdiam o direito à herança e o de ver os filhos. Seria justo se a mesma regra fosse sempre aplicada aos homens também.
Essas mulheres brancas eram responsáveis pela cozinha, administração da casa e educação dos filhos. Traziam de Portugal a tradição doceira e, com adaptações, fizeram dos doces um dos pilares da culinária baiana.
A maioria das famílias “brancas” continuava tendo como iaiá[1] moças descendentes de índios. A elite portuguesa esperava delas o mesmo comportamento das européias, mas a vida trancada em casa não caía bem a uma índia acostumada com a liberdade e o contato direto com a natureza, o que é perfeitamente compreensível. Elas conseguiam sair às ruas em visitas às igrejas (Salvador já tinha muitas) e casas de outras mulheres casadas e religiosas. O gosto dessas mulheres pela arte religiosa foi fundamental para o barroco baiano. O sangue índio ajudava na criação dos filhos: para um tupi, a vida da família gira em torno das crianças, dos curumins[2].